Sempre que vou a Salvador minha família inventa de ir a praia da Barra, uma das mais famosas da cidade. E deve ser correto afirmar que o sucesso só veio por causa do Farol da Barra, um dos pontos turísticos mais aclamados em Salvador junto com o Elevador Lacerda e o Pelourinho (lugares que pra mim já perderam a graça depois das inúmeras e forçadas visitas).
Já quando meus padrinhos que moram na cidade querem curtir uma praia, a ultima opção deles é a Barra. Eles sabem que o lugar não tem o espirito do soteropolitano, não tem ninguém vendendo aquele "queijinho esperto" no palito, picolé de limão e boia para crianças em um carrinho só, não terá uma um quiosque de confiança (alias nem quiosque tem na Barra), e o pior, não tem o soteropolitano!
Diferente da minha família que sempre da um pulo na Barra (só pela fama diga-se de passagem), meus padrinhos vão a uma praia mais animada e que é bem próxima da casa deles, A CANTA GALO!
Com certeza é o melhor nome de praia que existe, porque lá é desse jeito, assim que o galo canta tem nego dando uma de atleta e correndo na beirinha do mar. O nome já mostra que a praia está esta bombando desde cedo! Os quiosques abrem assim que os donos acordam, já que a venda é feita da janela da casa, que fica de frente pra areia da praia, Você não sabe se é cliente ou visita do dono do bar...
Ao contrario das praias monótonas e sem graça, a Canta Galo é emoção desde a hora que o galo canta até o sol se por! Tem tudo naquela praia, queijinho no palito, picolé de diversos sabores, vendedor de joia, tatuagem de rena que dura um ano e com certeza trará complicações pra saúde da sua pele, e tudo que uma boa praia deve ter! De 5 em 5 minutos você é abordado por um garoto vendendo ovos de codorna, caso desperte em você uma vontade repentina de comer ovos de codorna na praia as 14 horas de uma quarta-feira...
E caso todo esse marketing (gratuito!!) tenho sido em vão, vá ver imagens desse lugar paradisíaco no Google (porem ignore a imagem de um cara baleado na praia e de uma fogueira NADA A VER na beira do mar), você vai adorar todo o calor humano de um dos points do fim de semana do soteropolitano de raiz!
O céu em Salvador esta azul, eu esperava ver mais estralas aqui, tenho certeza que o céu do São Joaquim (bairro que eu moro em São Paulo), é mais estrelado que aqui no Uruguai (onde estou hospedado). Outra coisa que me chama atenção é que em todo o lugar em que estou, sempre aparece um individuo que coloca o carro na frente da varanda, ligar na musica da época e vai embora. Aqui só toca Pablo, e não aguento mais o cheiro de chifre queimado.
Fico abismado com o movimento e a forma que as pessoas se relacionam aqui. Tudo é falado muito alto e parece que tem mais pessoas na rua as 23 horas que as 11 da manha, mesmo sem nenhum centro de entretenimento por perto (ex:casas de show, bares bacanas com musica ao vivo, bar com mesa de sinuca...).
Tudo isso me intriga, devo ser sincero, mas nada tira minha vontade de estar aqui. Preciso aprender a ficar longe daquele bairro, me desprender mais daquele lugar. Aquele espaço me prende, e normalmente eu me imagino passando a vida toda vivendo na mesma rua, sempre vendo a mesmas arvores da varanda e criando os filhos nos mesmo ambientes em que fui criado.
Enquanto eu não conseguir me desligar um pouco do lugar que moro hoje, sempre será uma tortura a volta pra casa. Quando fico alguns dias fora de São Paulo sinto como se a cidade fosse outra, como se ela tivesse se transformado, me sinto um "turista" no espaço que cresci.
Passo horas pra escrever um texto com 5 ou 6 parágrafos, e já faz cerca de 83 minutos que estou sentado na varanda escrevendo. Consegue se lembrar do primeiro parágrafo do texto onde digo que o céu esta azul? Agora esta bastante nublado, mas eu acredito que o próximo dia será quente mesmo assim...
21/12/2014 - 00:05. Salvador-BA
Ps: O primeiro texto que escrevo estando fora de São Paulo.
Este texto tem tudo a ver
com o ultimo show da Pollaris no ano. Show este que de
longe foi o melhor da história da nossa banda. Também tem total relação com o
processo de criação e adaptação de cada música e com cada som e acorde
executado nos últimos meses ao lado do meu amigo e companheiro de banda Paulo
Henrique Lopes.
De uns tempos pra cá, minhas
experiências com a música estão se tornando cada dia mais "esgotantes".
A maneira que emprego a palavra “esgotante”, de certa forma, chega até a me
assustar, pois não sei dizer se tudo que se esgota pode se restaurar a ponto de
poder ser esgotado novamente (o que é a minha expectativa).
Minha relação com a música
sempre foi muito próxima. Eu até conseguiria recordar o que ouvia em cada época e
descrever diversos momentos apenas a partir da minha memória musical, quase
como se a musica gerasse em mim uma memoria auditiva sólida. Entretanto, não
consigo dizer quando exatamente comecei a ter uma relação de aprendizado e
crescimento mais orgânica com a música. Acredito que essa relação não surgiu
apenas quando comecei a tocar violão, que seria a percepção e o material se
fundindo, penso que ela surgiu muito antes.
Sabe aquela coisa de
observar um solo e achar que sabe fazer igual? Acho que todo musico já pensou
"eu conseguiria reproduzir isso!" sem ao menos saber o tom do acorde
tocado. Tenho até hoje esse maldito pensamento... Talvez seja porque minha real
intenção é sempre transmitir a mesma emoção que senti ao ouvir o solo pra quem estiver
ouvindo-o tocado por mim... E um belo solo ou uma música boa pode transmitir
uma gama muito diversa de sentimentos e sensações que podem ser desde felicidade,
euforia e motivação, até mesmo raiva, tristeza ou fé.
As experiências que tive com
a música podem ser colocadas em diferentes níveis de profundidade e interação,
organizadas de tal forma que possa se perceber a falta de equilíbrio que sempre
tive em relação ao fazer, a percepção e ao sentimento ou sensação que
transmitia.
Quando comecei a tocar,
meu objetivo inicial era imitar músicos e músicas que eu gostava. Mas o
processo de aprendizagem - que foi muito bem orientado por sinal -, me impediu
de me tornar apenas um simples imitador.
Algo engraçado foi que
acabei aprendendo a teoria e a técnica musical enquanto transmitia algo através
da música, algo importantíssimo no caso, a fé, apesar de eu não estar
especificamente em busca de fé no momento. Na época eu buscava apenas aprender
a tocar. E este aprendizado já era orgânico, porem sem profundidade, porque
havia um desequilíbrio tão grande entre tocar buscando apenas aprender e ter
que transmitir fé que a relação acabou por se dissolver.
Depois de certo nível
técnico alcançado, uma habilidade de observação mais refinada e o
aprofundamento nessa busca de entender o porquê de cada acorde, e o objetivo e
funcionalidade deles, posso dizer que alcancei níveis de interação com a música
muito mais orgânicos e fortes. E acho que no ultimo dia 30 consegui esgotar
como nunca esse poço de sentimentos e sensações que a música causa não só nos
outros, mas também em mim. Aliás, me esgotei fisicamente também, fui a exaustão
com 40 minutos dessa experiência quase impossível de explicar.
A experiência do ultimo
show liberou em mim uma anestesia de felicidade e uma injeção de animo que me fez
ter vontade de aprofundar-me mais e mais nesse lago de sentimentos e sensações
que é buscar uma relação cada vez mais orgânica com a música e com as pessoas.
Ao doar todas as minhas forças pra que as pessoas se sentissem bem e vê-las em
êxtase tive certeza de que estava chegando perto do objetivo que faz com que eu
me surpreenda toda vez que eu me lembro daquela tarde.
Naquele dia, naquele show,
senti-me na beira de um lago, e acredito que posso ir além. A busca agora é me
capacitar pra ao menos lavar meus pés no oceano de sentimentos e sensações que
me deixei conhecer.
Esquece de voltar! Haha :)
*Agradecimentos: Ao amigo e companheiro de movimento estudantil Daniel Clodoaldo, que revisou o texto acima, obrigado pelo apoio! A todos que trabalham no Teatro Leopoldo Fróes, em especial ao orientador do Projeto Vocacional Adriano Matos. Família e amigos pelo suporte e companheirismo em todas as horas!